Como Bolsonaro construiu a bandeira do ataque às urnas com o apoio de militares




A live de Jair Bolsonaro (PL) que lançou a bandeira principal de sua campanha à reeleição foi ao ar em agosto de 2021– mas a narrativa conspiratória começou a ser construída muito tempo antes e bebeu na fonte de um técnico em eletrônica que, sem provas, procurou militares bolsonaristas que estavam na ativa ainda na eleição de 2018.


O técnico de informática Marcelo Abrieli, que depôs à Polícia Federal no inquérito do Supremo Tribunal Federal (STF) que investiga a live por vazamento de informações sigilosas, contou que foi procurado pelo governo Bolsonaro em 2019 – e que teve reuniões com militares como Augusto Heleno e Luiz Eduardo Ramos, além do próprio presidente Bolsonaro.







Heleno e Ramos, hoje no governo, são militares que apoiam Bolsonaro desde quando havia dúvidas entre simpatizantes do presidente de que ele teria chances de vencer a eleição, em 2018. No caso de Ramos, no entanto, o peso do apoio era maior: ele era o comandante militar do Sudeste, estava na ativa na campanha de 2018 – e não escondia de ninguém o apoio a Bolsonaro na eleição, mesmo sendo criticado por colegas e ocupando cargo estratégico para as Forças Armadas.


A lealdade a Bolsonaro, então eleito, levou Ramos ao governo em 2019. Ainda general da ativa, assumiu a secretaria de governo. Depois, pressionado, passou para a reserva e foi para a Casa Civil – o principal cargo do governo.


Foi neste cargo que Ramos, junto com o general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e outros apoiadores próximos que estavam no governo desde o começo – "apoiadores raiz" – não só embarcaram como patrocinaram integralmente a construção da principal bandeira da campanha de Bolsonaro: atacar e duvidar do sistema eleitoral para tumultuar o processo democrático – em caso de derrota do presidente ou de vitória também.



Bolsonaro e esses militares são sócios, nas palavras de um investigador, da estratégia do tumulto do sistema eleitoral.


Desde 2019, Bolsonaro pediu a assessores, como Ramos, para levantar dados que pudessem alimentar sua teoria. O ministro, então, lembrou de um técnico de informática que o havia procurado em 2018, no auge da eleição presidencial, quando ele ainda era o comandante militar do Sudeste.


Marcelo Abrieli procurou Ramos, ainda na eleição de 2018, com o que ele chamava de "indícios" de que teria havido fraude na eleição de 2014, quando o tucano Aécio Neves perdeu para a petista Dilma Rousseff. A visita de Abrieli, feita a Ramos, contou com diversas testemunhas do comando militar do Sudeste.


Após sua apresentação, o técnico de informática foi orientado a procurar o Gabinete de Segurança Institucional já que, segundo essa versão, ele teria ouvido naquela visita que aquele assunto não era com o Exército e que ele deveria procurar as autoridades competentes – o que ele não havia feito ainda pois não teria confiança em ninguém a não ser no Exército.


De volta a 2019, Ramos, consultado por Bolsonaro sobre o tema, lembrou desse técnico e o procurou. Entre 2019 e 2021, esse núcleo escalado por Bolsonaro para levantar dados sobre o sistema eleitoral manteve contato com Abrieli – inclusive, pessoalmente, quando ele foi convidado a ir a Brasília para uma reunião com o próprio presidente Bolsonaro.



Foi então que Bolsonaro decidiu fazer a live no Palácio do Alvorada. A princípio, a ideia era que ele não participasse pessoalmente, já que havia uma avaliação de que não só não havia provas do que ele queria sustentar – como a live estava frágil e poderia ser alvo de investigação.


Bolsonaro, como de praxe, ignorou os conselhos e liderou a live, que virou alvo de investigação do Supremo Tribunal Federal e lançou a estratégia principal do comitê de reeleição de Bolsonaro para tumultuar o processo eleitoral: lançar suposições sobre as urnas eletrônicas e confrontar a Justiça Eleitoral.


Nos bastidores, há uma preocupação de autoridades de que essa estratégia visa criar um ambiente para que o presidente (se tiver apoio das Forças Armadas) consiga levar adiante uma ruptura institucional caso seja derrotado no pleito de outubro.


Entre alguns grupos de militares, como o blog já publicou, a resposta corrente é que o "antipetismo" é o que os une a Bolsonaro, mas que o presidente não teria "força" para levar adiante uma ruptura – mesmo que militares do governo e ligados à política patrocinem a narrativa do tumulto às urnas.

G1
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