SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Envolto em indefinição quanto à retomada de seu acordo nuclear de 2015 com os Estados Unidos, o Irã começou a atualizar o seu programa de enriquecimento de urânio.
A informação é de um relatório do órgão de vigilância nuclear da ONU, a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), obtido nesta segunda-feira (29) pela agência Reuters.
Segundo o documento, há mais de um ano um de três conjuntos de centrífugas IR-6 instaladas no complexo nuclear de Natanz enriquece urânio em um nível de até 60% de pureza. O IR-6 é o modelo de centrífuga mais avançado do mercado –segundo o acordo de 2015, o único modelo que o Irã poderia usar para esse fim é o IR-1, de primeira geração.
Um dos outros dois conjuntos instalados em Natanz passa por um processo anterior ao enriquecimento de urânio. E o outro ainda foi alimentado com material nuclear. No relatório a que a Reuters teve acesso, dirigido aos Estados-membros da ONU, a agência relata que novas observações do tipo foram feitas na planta neste domingo (28).
De acordo com o documento, avanços nesse sentido acontecem em outros locais além de Natanz. Um outro conjunto de centrífugas teria começado a enriquecer urânio em um nível de 20% numa planta nuclear incrustada numa montanha em Fordow. Natanz e Fordow ficam, respectivamente, a cerca de quatro e duas horas de carro da capital Teerã.
Nesta segunda, o presidente iraniano, Ebrahim Raisi, criticou o relatório da agência das Nações Unidas, dizendo que ele põe em suspensão as discussões sobre o tratado nuclear. "Todos os temas [relacionados à AIEA] devem ser resolvidos. Se não forem, não faz sentido falar do acordo", disse, em entrevista coletiva.
O Irã já diversas vezes que o órgão encerre suas investigações no país, mas o diretor-geral Rafael Grossi reforçou na semana passada, em entrevista à rede CNN, que não tinha essa intenção.
O tratado assinado por Irã e EUA em 2015 estabelecia uma série de limites às atividades nucleares iranianas em troca do fim das sanções americanas à nação do Oriente Médio. O acordo, que teria validade até 2031, foi rompido pela gestão de Donald Trump em 2018, ao que o Irã respondeu desobedecendo uma a uma as restrições anteriormente impostas.
No ano passado, pouco depois da posse de Joe Biden, Teerã e Washington voltaram a conversar sobre o tratado. Houve mais um ano de negociações indiretas, até que, no mês passado a União Europeia agiu na mediação de conversas para tentar fazer com que os dois lados cheguem a um meio-termo.
Entre os principais empecilhos travando as conversas estavam exigências como a de que os EUA encerrasse sanções contra a Guarda Revolucionária, a força de segurança de elite do país. Os americanos designam o grupo como uma organização terrorista internacional.
O Irã disse recentemente que em breve responderá aos comentários americanos sobre a versão mais atualizada do tratado. O novo acordo põe um limite de pureza do enriquecimento de urânio em 3,67%. Isso significa que o Teerã teria que voltar atrás em boa parte do enriquecimento que vem promovendo.
Ainda há a possibilidade de que a instalação de máquinas avançadas em locais subterrâneos como Natanz e Fordow seja um sinal para qualquer nação que queira atacá-los de que o acordo é inválido, já que não está claro se ataques aéreos em locais do tipo são efetivos.
Potências ocidentais temem que o Irã esteja construindo bombas nucleares. O país nega essa intenção, mas em julho um assessor sênior do líder supremo do país, Ali Khamenei, disse em entrevista à rede Al Jazeera que Teerã é tecnicamente capaz de fabricar uma bomba nuclear, mas ainda não decidiu se vai montá-la.
"Em poucos dias, conseguimos enriquecer urânio em até 60% e podemos facilmente produzir urânio enriquecido em 90%", disse Kamal Kharrazi. O enriquecimento adequado para a construção de uma bomba nuclear é de pelo menos 90%.
Os comentários foram feitos um dia depois de o presidente dos EUA, Joe Biden, terminar uma viagem a Israel e Arábia Saudita, em que prometeu impedir o Irã de "adquirir uma arma nuclear".