(FOLHAPRESS) - A ameaça de Donald Trump de ampliar tarifas a bens importados do México e Canadá no primeiro dia como presidente dos Estados Unidos gera preocupação entre comerciantes e industriais, diante do alerta de economistas de que haverá uma alta nos preços de produtos de diversos setores.
A eleição do republicano se deveu em parte à insatisfação dos americanos com a situação econômica, segundo pesquisas. O país foi acometido por elevados índices de inflação, que chegou a 9,1% em meados de 2022, depois da pandemia do Covid-19, o que levou a uma piora na qualidade de vida da população.
O aviso de economistas é que o plano de Trump de impor impostos a produtos oriundos de outros países pode gerar novo aumento na inflação, e antes mesmo de elas serem consolidadas.
O presidente eleito afirmou na semana passada que vai impor tarifas de 25% sobre produtos do México e do Canadá no seu primeiro dia de governo, além de aumentar em 10% as taxas aplicadas à China. Ele tomará posse em 20 de janeiro de 2025. A justificativa do republicano é que os países vizinhos não estão combatendo o tráfico de drogas a migração ilegal para os Estados Unidos.
"Esta tarifa permanecerá em vigor até que as drogas, em particular o fentanil, e todos os imigrantes ilegais parem essa a invasão do nosso país. Tanto o México quanto o Canadá têm o direito e o poder absolutos de resolver facilmente este problema que se arrasta há muito tempo. Exigimos, portanto, que usem esse poder, e até que o façam, é hora de pagarem um preço muito alto."
A promessa gerou reação dos países, que criticaram essa hipótese, mas pode ter influência antes mesmo de entrar em vigor.
No sábado (30), os Brics também tornaram-se alvo do presidente eleito, que ameaçou impor tarifas de 100% sobre o bloco caso haja apoio a uma moeda que ameace a hegemonia do dólar nas relações comerciais entre os países.
"A mera ameaça das tarifas afeta as decisões econômicas atuais. Alguns importadores podem estocar para evitar tarifas potenciais, enquanto outros adiarão investimentos relacionados à importação até obterem mais certeza sobre a política comercial dos EUA", diz à reportagem o professor Nuno Limão, da Universidade Georgetown.
"Empresas estrangeiras nos países-alvo também adiarão investimentos em exportação, o que pode reduzir ainda mais o fornecimento para os EUA e aumentar os preços", diz.
O professor de economia cita que isso ocorreu no Reino Unido a partir de 2016, quando o país começou a discussão sobre deixar a União Europeia, o que se concretizou em 2020. Artigo publicado no Journal of International Economics por Limão, em parceria com Alejandro Graziano e Kyle Handley, mostra que a "incerteza política, impulsionada pela renegociação de acordos, impacta os preços".
Os acadêmicos estudaram o caso do Brexit -saída do Reino Unido da União Europeia- e concluíram que antes mesmo da conclusão do processo, houve aumento dos preços de produtos, que ficaram expostos a tarifas mais elevadas.
No caso dos Estados Unidos, um conjunto de bens podem ser especificamente impactados pela imposição de tarifas a México e Canadá. O país importa carros e peças do México e Canadá. Deste último, recebe também insumos primários, como ferro, alumínio e gás. A China exporta uma gama de produtos, entre eles computadores, brinquedos, entre outros.
"Vários desses são insumos importantes para indústrias subsequentes, então tarifas sobre eles aumentarão os preços dos bens que produzem", diz Limão.
Como mostrou o The New York Times, o plano de Trump levou preocupação à indústria automobilística, pela dependência do México e do Canadá para obter peças e fabricar os veículos.
"Provavelmente não há uma única fábrica de montagem em Michigan, Ohio, Illinois e Texas que não seria imediatamente afetada por uma tarifa de 25%", afirmou Patrick Anderson, CEO da empresa de consultoria Anderson Economic Group, em Michigan, ao jornal americano
A imposição de tarifas também tem o potencial de elevar o valor da gasolina para os motoristas.
A CNN mostrou que 90% dos avocados, tipo de abacate consumido nos Estados Unidos, consumidos em 2022 foram importados, dos quais 89% oriundos do México. Este é outro produto que pode ser afetado, afirmou o veículo em reportagem no qual aconselha consumidores a se anteciparem à eventual taxação na compra de produtos.
A ameaça de Trump com o aumento das tarifas passa pela negociação de obter benefícios em outros setores com esses países, como fez no primeiro mandato. No caso de México e Canadá, ele quer políticas mais eficientes que visem a reduzir a imigração e o que o presidente eleito vê como consequente tráfico de drogas nos EUA.
A presidente do México, Claudia Sheinbaum reagiu. "O fenômeno da migração ou o consumo de drogas nos EUA não será resolvido por ameaças ou com tarifas", afirmou em carta enviada a Trump. Os dois líderes falaram ao telefone. Trump chegou a dizer que Sheinbaum havia se comprometido a fechar as fronteiras, algo que a presidente negou. A mexicana disse ter conversado apenas sobre a política migratória.
O ministro da Economia do México, Marcelo Ebrard, afirmou que caso leve adiante a ideia de impor a tarifa de 25% sobre todos os produtos mexicanos eliminaria 400 mil empregos nos Estados Unidos.
Nesta semana, o presidente Joe Biden pediu que Trump revisse as ameaças. Para o democrata, elas têm o potencial de prejudicar a relação com os países vizinhos."Estamos cercados pelo Oceano Pacífico, pelo Oceano Atlântico e por dois aliados, México e Canadá. A última coisa que precisamos fazer é começar a estragar essas relações", disse o presidente em entrevista a jornalistas.